Ele tem a fuselagem branca, as listras azuis emolduradas em discreto dourado, que o fazem lindo para meus olhos. Meu Sêneca II, fabricado em 1980 pela Embraer, é de uma safra rara. Estou com ele há pouco mais de um ano e está equipado com IFR King digital, radar Bendix colorido, GPS Garmin 100, piloto automático III eixos, diretor de vôo, transponder kt-76, HSI, RMI, rádio SSB,etc, etc... Essa sopa de consoantes me deleita. Adoro aviões, e este em particular. Como os vôos são basicamente para transporte de mercadorias, os bancos destinados a passageiros foram retirados, ficando apenas o do piloto e mais um de passageiro, lado a lado, à frente na cabine. Feitos em fino couro bege, eles são uma beleza. O carpete marrom claro já mostra o excesso de sujeira acumulada, resquícios das cargas levadas pra todos os cantos dessa bela, misteriosa Amazônia. O log-book, a caderneta de operações da aeronave, já acumula 3.200 horas voadas, 330 delas sob minha pilotagem. Algumas pequenas revisões de praxe estão atrasadas, mas isso a gente vê depois.
O Cherokee, monomotor em que eu voava até quatorze meses atrás foi dado como parte de pagamento do Sêneca. Aliás, a história não é só essa. O ex-dono dele, piloto conhecido na região pelo apelido de “Paulista” e pelo cuidado e competência ao manche, foi voar uma outra aeronave, um Bonanza de cauda em “T”, de um garimpeiro que precisava de socorro médico e estava sem condições de pilotar. Quarenta minutos após a decolagem, uma pane de magnetos levou o Bonanza ao chão. Morreram os três ocupantes: o garimpeiro, um gerente dele e nosso companheiro piloto. Paulista deixou viúva e dois filhos em Presidente Prudente. O Sêneca, recém financiado pelo já não mais piloto, me foi cedido por sua viúva pelo meu Cherokee quitado, mais uma quantia guardada na marra, e mais algum emprestado de outros pilotos, uma química danada. Assim, passei a voar o que, na aviação geral é a melhor relação ente custo, benefício e segurança. O carnê das mais de quarenta parcelas ainda devidas ao banco ainda andou comigo, sempre à mão, enquanto ainda conseguia pagá-las. Agora, só um milagre ou prêmio de loteria me salvaria do arresto já impetrado pelo banco. Minha belezinha riscada de azul logo estaria num pátio de leilões.
“Mas sinto que amanhã é o primeiro dia da mais espetacular guinada já acontecida em minha vida!”. Esse pensamento estava me martelando. Então, abri o avião, inspecionei as tomadas de ar dos motores, flexíveis do sistema hidráulico do trem de pouso, calibrei pneus, já meio gastos, e por isso impediam a calibragem correta, também drenei os tanques, arejei a cabine, fiz o check dos equipamentos e superfícies de controle, revi o alinhamento de rebites das longarinas e tudo o que eu lembrava ser importante do que me disse o Aureolino, instrutor já na época com mais de trinta anos de Escolinha na distante e querida Goiânia, antes de funcionarmos o Aeronca Chief, de asas enteladas, no qual fiz instrução de piloto privado. Fui bom aluno e logo cedo aprendi a reconhecer um “manicaca”, o barbeiro dos céus.
As lembranças de vinte e cinco anos atrás vieram como brisa fina e fresca. Eu ainda tinha cabelos, muitos e longos, querer voar parecia brincadeira a todos que me ouviam desfiar meus planos. Meu pai, patrocinador incansável de minhas vontades, não pensou duas vezes: me pagou o curso e ainda me ajudaria a interpretar cartas de navegação e mapas meteorológicos.
Meu pai. Homem de grande conhecimento geral, muita visão e um talento formidável para o prejuízo. Empreendedor nato, fazia tudo certo, até ser passado para trás, por alguém menos competente, mas malandro. Sua inocência virou folclore na família. A brisa parou de soprar. Perdeu-se no abismo que se abriu entre meu pai e eu no decorrer destes muitos e pouco alegres anos. Oh, meu pai, não tivesse havido aquele infame infarto fulminante que o matou! Seis anos já se passaram desde que esta notícia inexorável chegou pelas grades da cela onde estava, por ter sido incriminado por tráfico. Injustamente, hoje já se sabe. Só não sei se a notícia da minha prisão chegou antes ou depois da fatal falência do coração amoroso daquele homem, do qual eu não soube aproveitar quase nada.
O pequeno caminhão tanque se aproximou lentamente. Da cabine desceram o motorista e um ajudante. Macacões impecáveis com o logotipo da Shell. Piada. O combustível que abastece os aviões nesta região vem das mais diversas distribuidoras, sofre batismos e desvios de todo tipo. Às vezes não tem nem o cheiro da saudosa e pura gasolina verde, a GAV 100/130. Mas, vá lá: é a que tem e, pior ainda, devo um bocado deste coquetel ao retalhista, gente boa, mas que, quando me cobra os atrasados, me constrange e faz sofrer.
- E aí, André, vai uma “gasosa” na máquina? Soubemos que vai voar amanhã bem cedo...- O rapaz negro era alto como bambu de colher mamão.
- Vou Pelé. Faça o teste do combustível, complete os tanques e me passe a boleta para documentar o log-book. – Notei a estranheza dos dois, ao me ver solicitar o teste de qualidade padrão, pouco comum naquelas condições ruins de operação.
- Ok, doutor. Tudo conforme o Manual...- Gesticulou, com ginga incrível.
- Vou pagar em cheque. À vista, com fundos. - Assim esperava, vamos torcer para que o dinheiro do garimpeiro já estivesse na conta.
- O patrão vai te telefonar hoje de novo, esteja preparado...- Esse Pelé adora dar esse tipo de notícia, mais para me ver sofrer do que para cumprir a obrigação de ter dado o recado.
- Estou resolvendo essa situação. Eu explico para ele. – Talvez assim ele entenda que este é um assunto entre o patrão dele e eu...
Dever dinheiro a alguém me mata. E, por azar, meus credores querem, ao me cobrar, me fazer acreditar que a quebra na promessa de pagamento, além de inadmissível, me coloca na condição de bandido. Ora, se eles me convencerem disso, certamente passaria a negar a dívida, o que me confunde e chateia. Aquela frase cínica: “devo, não nego, pago quando puder” vai piorar: “devo, não pago, nego enquanto puder”.
Duas da tarde. A esta hora o calor já não mais incomoda. Ele é parte de seu ser, tomado por uma onda de combustível de foguete misturado com anestésico. Você não mais sente o calor. Você está em chamas e não sente. A roupa molhada e colada ao corpo como uma embalagem à vácuo, parece a pele cheia de dobras de um lagarto. É isso, sua porção lagarto assume sua mente e o calor indecente, que já é algo sublimado, desaparece sob aquele torpor.
Assim, como lagarto obediente, termino as tarefas propostas: limpo, ajeito, tranco, amarro, e, ao final, me despeço da ainda minha máquina de voar. Não tinha tido ainda a coragem de pensar que, afinal, posso não conseguir evitar que o banco a tome de mim.
Paro a bicicleta sem freio à porta do banco, e encosto meu descascado camelo à mureta encardida que limita um canteiro de plantas, já extinto e transformado em lixeira. A humilhante porta giratória me dá mais um baile. Pra variar, só dois dos seis caixas pensados pelo financista bondoso, estavam funcionando. Filas enormes, porque muitas são as pessoas que têm pouco dinheiro. Crianças e velhos agora são usados para se passar à frente, quase todo mundo se faz acompanhar de um ou outro, todos gostam de levar vantagem em tudo, certo? Calor. Minha porção lagarto se posta imóvel ao fim da fila. Vai demorar. Tudo bem...
O dinheiro, distribuído aqui e ali com a parcimônia que não faz meu tipo, acabou rápido. Pudera! Cidade pequena, os credores te pegam à saída do banco. Estou liso de novo. Salvei o da lavadeira, o do cigarro, ainda bem...Tem o vôo de amanhã, provavelmente o Mauro já pegou o cheque daquele topógrafo. Daqui a dois dias, o lagarto se posta novamente nessa fila, pega o dinheiro, causa outra roda de credores, ali mesmo, na calçada, e por aí vai.
- André, meu ás preferido! – O Mauro tinha essa mania de sair do nada e pular na sua frente, solfejando elogios mentirosos. – Está tudo pronto para amanhã? Já abasteceu? A carga dos topógrafos está pronta, estou vindo de lá agora. Vai estar na pista às 6 e meia de amanhã. Seiscentos e vinte quilos, eu mesmo pesei. Já fizeram contato, entenderam direitinho o negócio de prestar atenção ao barulho, da fumaça, tudo beleza!
Tem desses sujeitos que acham que otimismo é um estado de espírito. Outros se escondem atrás dele para fugir da realidade. O Mauro faz um e outro. De onde ele tirou essa de que tudo já foi combinado e vai dar certo, como se fosse por música? Ora, essa! É claro que vai haver problemas. Tomara que pequenos e contornáveis, mas com certeza haverá um monte deles.
Uma das lições de meu pai, que também bateu na trave de meus ouvidos e não entrou, era sobre a antecipação de problemas. Ele dizia que ao invés de gastar tempo antecipando os milhares de problemas que poderiam surgir numa determinada situação e ficar imaginando uma solução para cada um deles, era melhor estar atento e disposto para, se surgir um abacaxi, resolvê-lo segundo seus instintos. Apenas se e só no momento em que surgir. Essa valiosa lição, perdida há tanto tempo, a vida me ensinou mais tarde, aos trancos e barrancos. Um pouco tarde demais, mas quem podia adivinhar?
-Ok, Mauro. E aí, já surgiu outra coisa? Você sabe o quanto estou enrolado. Tem o Banco, a Alice (minha ex), a gasolina, a lavadeira que não pode atrasar o dízimo, o empréstimo que tomei do Chico, estou mesmo lascado...- A lista não para de crescer, e já é um dos motivos para a esperada amnésia que me traz o conhaque, meu amigo mudo de tantas horas, ultimamente.
- André, meu amigo. Estou cuidando de você. A empresa de topografia deve precisar de mais um ou dois desses vôos. O chefe cinta-larga está esperando um carregamento de armas e munições que estou ajeitando para você levar... – Aquela falsa alegria tinha que esconder alguma tramóia. Esse cara não engana ninguém!
- Mauro, pelo amor de Deus! Isso de contrabando de armas é fria, preciso deixar desse tipo de coisa, você sabe! Isso dá cana e feia... – Falei com uma raiva que, sabia, bateria em ouvidos moucos...
-Andrezinho, essas armas vão chegar lá de um jeito ou de outro, é claro que você vai levar, nós precisamos da grana... – O Mauro me lembrava daqueles cafetões de filmes americanos dos anos setenta, só faltava o blazer brilhante e o cabelo pregando de brilhantina. Mania de achar que se está imune para as conseqüências do mau-feito. – Você vai e pronto! – Ameaçou de mentirinha...
A área garimpeira era no Parque Aripuanã, reserva indígena do povo dos “Cinta-Largas”, nativos que controlavam a entrada e saída de garimpeiros, distribuíam áreas de lavra, desmatavam (o índio é inimputável, pode desmatar e matar, que não vai preso, a Lei os trata como crianças), tudo em troca de 20% do diamante garimpado. Às vezes, esse arrendamento era pago com armas, contrabandeadas via Paraguai. Os “Cintas Largas” adoram camionetas japonesas e armas de grosso calibre. Já havia feito um vôo desses. Voei, ainda no valente Cherokee, para sudeste, até Sucre, na Bolívia, onde, em uma pista clandestina fui carregado com 50 fuzis do tipo AR-15, não tenho certeza, pois só os havia visto antes pela televisão. Na volta, reabastecimento em Guajará-Mirim, onde morri de medo de ser descoberto, e voei direto até a reserva. Pousei na pista perto da aldeia onde, sem que eu percebesse antes, já estava pousado um Baron que, eu já sabia, era usado por agentes do Ibama, que por aqui exibem autoridade de Policia Federal. Tremi. Estava tudo perdido. Abaixei a cabeça sobre o manche, escolhendo entre me deixar prender ou tentar fugir, quando escutei o barulho de festa em volta do avião. Quando levantei os olhos, o chefe Nacoça Napara Piu Cinta Larga, já havia aberto a porta e arrastado para fora uma das compridas caixas onde estavam os rifles. Em um minuto, duas ou três dessas armas já estavam municiadas e atirando para o alto. Os estampidos tinham o eco da morte, me arrepiaram todo! E tome alegria. E os agentes que haviam chegado no Baron, onde estavam? No meio da festa, bebendo, rindo, e, pior, experimentando os rifles! Fiz que não os vi, desembarquei, empurrei uma das asas até que o avião fizesse a volta, afastei mais alguns índios alegres de tanta cachaça, constatei que a carga já não mais estava na cabine, embarquei, fechei e travei a porta, pulei no manche. Liguei a bomba de combustível, magnetos, manete, contato, o rugido familiar do Lycoming de 140 hp encheu o ar, soltei os freios, flaps a 10 graus e tome gás! Quando já estava a 700 pés é que voltei a respirar.
Fiz esse vôo numa época em que desconhecia a estranha simbiose entre fiscais e agentes do governo com madeireiros, fazendeiros, garimpeiros e índios. Quando pousei em Pimenta e o Mauro veio me perguntar do vôo, ainda estava esbaforido e contei tudo de uma vez só. Só percebi que ele ria a valer depois que terminei. Êta brasilzinho, viu!
Eu só gostava de coisa mal-feita quando queria atingir meu pai. Não me perguntem por que. Eu fui mimado e amado demais. Meu pai chegava a adivinhar minhas vontades e minha mãe era só cuidado. Fui um adolescente mal-educado, egoísta e voluntarioso. Reconheço. Não via defeitos em meus pais e já percebia alguns dos meus. Acho que por isso queria puni-los. Naquela época acreditava que o destino tinha a obrigação de conspirar para que eu tivesse uma vida no mínimo perfeita. Os defeitos, eu já os tinha, mas eram meus e ninguém tinha nada com isso. O papel dos outros era só cuidar para que fosse providenciado o que me faltava. Não sei direito, evito pensar no assunto. A consciência doeria demais...
Mas o Mauro... Gente muito boa, foi representante de remédios, estava bem de vida, quando aceitou o convite de um cunhado para ser sócio dele numa balsa no garimpo de ouro no Rio Madeira. Por oito anos o ouro de aluvião, juntado pela correnteza forte do rio forçando pelas fraldas de pedras, atraiu gente do País inteiro. O rio Madeira virou uma Serra Pelada fluvial, uma Babel de sotaques. Centenas de dragas montadas em balsas, que tinham acomodações para até trinta homens, reviraram, dia e noite, o leito encoberto por águas sempre turvas. Topou o desafio, tiveram sorte logo de cara, gostou da vida de garimpeiro, torrou muito daquele dinheiro fácil com mulheres e jogo, abandonou a família porque agora, livre, podia tudo. Mas o ouro acabou. Falido, veio para Pimenta por acidente e foi ficando. Algumas cidades têm vocação para curva de rio: só pára garrancho. Acho que esta cidade também é assim. E o Mauro foi ficando, a comunicação fácil adquirida na profissão de vendedor foi o gancho para virar agenciador de cargas entre os pilotos do lugar.
Da vida de representante de remédios, conta sempre das farras homéricas em hotéis de São Paulo patrocinadas pelos laboratórios de fármacos. Vender remédios era uma arte que, quando desvendada nas longas conversas que tínhamos quase sempre à tardinha, nas cadeiras de espaguete remendado, à porta do hotel, me encheu de asco: o mercado de remédios vive às custas de comissões obscenas, repassadas em dinheiro vivo, para os charlatões e falsos magos que sempre empurram aquelas porcarias nos desesperançados doentes, que raramente tem a sorte de ser atendidos por médico ou farmacêutico isento.
Hoje, o Mauro vive até bem, continhas em dia, já sofre menos da saudade da mulher e filha, que nem desconfiam de seu paradeiro, devem até pensar que se afogou. Mais um com a vida enrolada...Mas, quem sou eu para falar?
- André, o que foi compadre? – Mauro era uberabense, o sotaque caipira meio forçado, acho que para divertir o interlocutor. Chegava a ser divertida sua imitação de mineirinho caipira – Está sonhando? Um doce para saber o que tanto você pensa. Por um momento, me pareceu que estava pensando na vida. E, você sabe, de pensar morreu um burro... – Brincou, meio sem graça, sabia que tinha forçado a barra...
- Já passou, Mauro, tá tudo bem. O negócio das armas me chateou. Mas, vá lá, se pintar eu faço de novo, só quero que você peça um pouco mais pelo serviço. Vou comer alguma coisa e tentar dormir mais cedo. Amanhã o dia vai ser duro.
- André, por favor, não beba até amanhã, fica frio. Até sua volta já vou ter mais trabalho para você, vamos aproveitar a maré boa, você precisa sair deste atoleiro e estou a fim de te ajudar... – Agora seu tom era sério, e eu o preferia assim.
- Ok, você sabe que estou tentando. Só vou ao Plínio hoje para jogar conversa fora. Apareça por lá. – Não era um convite e meu amigo sabia disso.
- Hoje vou a Cacoal, só volto amanhã. Inclusive, devem estar chegando os pneus que você pediu. E depois, tem uma professorinha me esperando por lá. Tem vezes que acho que o destino talvez permita que eu reconstrua minha vida. – Engasgou, a culpa atravessou a goela daquele vivente. Me deu pena, mas, que remédio?
Culpa. As besteiras que a gente faz vão deixando um limo, um mofo, que começa a se acumular pelas dobras da pele e logo já são uma corcunda de duzentos quilos pesando sobre sua carcaça. Achar o culpado é o mote de novelas, filmes, livros, causas jurídicas, inquéritos policiais, fofocas entre vizinhos, brigas de casais, discussões entre pais e filhos, e mais. Se as besteiras que fazemos nos enchem de culpa, é natural aliviá-la tentando costurar um outro culpado na história. Bati o carro, mas aquele ali me fechou. Não paguei, porque não recebi. Fiz, mas ela também fez. E etcetera. E aí vem meu pai de novo, que dizia ser pouco importante achar culpados. Precisamos aceitar a culpa como parte da qualidade de assumir nossos erros, ele disse várias vezes ao meu ouvido surdo. Aceitar que erramos é a garantia de errar menos ou até não errar na próxima. Diminuir nossa carga culpando sofregamente a outros, nos fará errar de novo. Vou me lembrar de dizer isso ao Mauro. A culpa que carrega por ter abandonado a família precisa ser assumida, entendida, quantificada, e mesmo que não perdoada, que sirva de alerta para a nova tentativa com sua professorinha...
Resolvi encompridar o caminho de volta ao hotel. Montei a bicicleta, e concentrei o peso num dos pedais. Pedal, nada. Dele só restava a cânula de lata polida por centenas de solados e pés descalços, nos quais imprimia dor pela concentração do peso. E dói mesmo. A vantagem é que a bicicleta se encarregava dos gemidos. Altos e estridentes, provavelmente falta de graxa, iam abrindo caminho pela rua de poeira. Fui até o mercadinho no final da rua. Gilete, sabonete, sandália de borracha, cigarros. Engraçado, tive a impressão de estar reduzido a tão pouco...
Nenhum comentário:
Postar um comentário