- Victor Oscar November, você está ai? – Aquela voz do além não era do Pebinha... Levantei os olhos, acordei, aprumei os ombros e levei a mão ao fone.
- Positivo. Quem está chamando? – Já tinha esquecido o protocolo - É Vilhena?
- Não, estou voando um curso paralelo ao seu, às cinco horas.- Acho que piloto de avião vê filme demais. Cinco horas. Bem atrás, à direita. – Meu nome é Alex, acho que ainda se lembra de mim. Estou baseado em Porto Velho, já te vi em Pimenta Bueno, tenho voado um Cessna 180 Skylane da barriga vermelha...- Lembrei, era um cara moreno, fivela de peão de rodeio...
- Ah, sei. Conhece alguma pista que eu possa alcançar em vinte minutos? – Esperança é um negócio engraçado...
- Nadinha. Pouco conheço da região e estou mudando o curso para Guajará-Mirim. Estou acompanhando seu mayday pelo rádio e tentei alinhar, mas não tenho velocidade para tanto. O que posso fazer por você, além de rezar? – Pela primeira vez achei importante que alguém rezasse por mim.
- Acho que muito pouco. Mas obrigado assim mesmo. Estou tentando encontrar um lugar para pouso. Estou reportando minha rota para o controle de Vilhena.- Engasguei.
- Boa sorte, estou aproando Guajará...- a voz sem rosto se despediu.
Dezenove minutos, no máximo. Não tinha noção exata da autonomia com aquela porta aberta. Sabia que o arrasto aumentava o consumo, mas não sabia em quanto. Imaginava que uns quinze, vinte por cento. Estava chutando o tempo que me restava, mas e daí? E se fossem mais cinco ou menos cinco minutos? E se fossem dez por cento, ou quinze?
Dez por cento. Bons tempos, aqueles. Meu pai, coitado, numa de suas empresas infalíveis, que quase sempre faliram, prestava serviços para um órgão do governo estadual. Tudo na base do dez por cento. Corrupção é um câncer, mas virou regra de um jogo onde todos perdem, menos o politiquinho da vez. Mas, a história é outra. Prestados os serviços, meu pobre pai emitiu a tão suada fatura e ficou acompanhando o processo que culminaria no sonhado dinheiro. Imaginando que a taxa de corrupção só seria devida no ato do pagamento, ficou mofando nos corredores da repartição pública, até que um funcionário zeloso e condolente deu a dica: o processo precisa da chancela de fulano de tal. Lá foi o velho procurar o tal fulano, que diligentemente cobrou os dez por cento. Meu pai fez o cheque, achando que estava cumprindo o combinado, apesar de antes da hora. O processo andou, chegou à tesouraria e ... Parou de novo. Dez por cento ou nada feito. E agora, como explicar a este barnabé que a propina já havia sido paga? Resolveu contar. Correria, telefones gritando, o vespeiro se agitou. Resultado: mais dez por cento, senão nada feito. Outro cheque. Mas que merda!
Bons tempos aqueles. Eu já peguei tempos piores. A corrupção tomou conta de tudo, dez por cento é ninharia que ninguém mais quer. Nada é feito às claras, montaram um jogo em que você é o pato.
Nas tentativas que fiz para empreender e trabalhar por conta própria, tudo começava ou terminava num balcão de repartição pública onde um funcionário público, pago com dinheiro público, tinha todo o tempo do mundo para explicar que o que eu queria, quase sempre um papelucho com um carimbozinho e uma garatuja de unzinho daqueles ali, era coisa impossível de ser feita com tanta rapidez. Mas, se o besta aí tiver muita pressa e mais um dinheirinho, tudo bem. E assim é a polícia, o departamento de trânsito, governos, as agências tributárias, as prefeituras, secretarias judiciárias, hospitais, escolas, câmaras legislativas e tudo o mais. Por que? Vi o sofrimento de meu pai. Depois na minha própria pele. A corrupção virou um carrapato maior do que a vaca. Frase de meu pai. A esperança dele era que o carrapato, na sede insaciável pelo sangue da vaca, chuparia até a penúltima gota. Mas não a última. Essa a vaca não deixaria. E o carrapato morreria de fome, e cairia. E a vaca exangue, mas viva, conseguiria se safar. É quase isso. O que meu esperançoso e inocente pai não sabia é que se a coitada da vaca sobreviver, outro carrapato voraz estará a postos.
Estes anos todos me deixaram ser pessimista. Já que a realidade é uma espiral para o mal feito, ser pessimista é questão apenas de se estar com os olhos abertos. Mas para cada pobre diabo que morria na fila do pronto socorro, via um corrupto desviando o dinheiro que compraria o equipamento que faltou. Para cada criança fora da escola, via um corrupto que desviou o dinheiro que edificaria a sala de aula que não se construiu. Para cada mau motorista, via um guarda de trânsito que preferia dar desconto na multa para que ela fosse paga à vista, ali na hora. Para cada acidente numa estrada esburacada, via um barnabé embolsando alto em troca da reforma paga e não feita. Falta esgoto? Dinheiro tinha, só que foi para o ralo dourado de alguém. E as obras contra a seca, poços e açudes, que o nordeste tanto precisava, saciaram a sede de dinheiro sujo daqueles coronéis. E assim falta dinheiro para o financiamento de tudo que precisamos.
Confesso agora que, diante dos nojentos aos quais fui obrigado a subornar, devia ter tido a atitude que o brasileiro tem que tomar contra essa epidemia nacional que é a corrupção. Estamos demorando entender que esse é o mal que está na raiz de todos os nossos problemas.
Várias foram as vezes em que vi no noticiário que protagonistas de escândalos de corrupção foram presos. Passariam o resto de seus dias na cadeia e etc. Qual nada! Estiveram presos porque já não mais queriam repartir seu dinheiro sujo com policiais e promotores também corruptos. Presos, ficavam só até a extinção de seus recursos. Assim que ficaram lisos, foram soltos. A brincadeira é essa. O corrupto de ontem, para escapar da merecida punição, põe na roda mais meia dúzia de corrompidos que passam a gostar da coisa, a purulência só vai aumentando, impunidade é o que não falta.
Meu pai era um desses otimistas incorrigíveis. Dizia que consertar o País era fácil, se resumiria a um ataque nacionalista contra a corrupção. Coitado! O brasileiro tem a corrupção no sangue, começa desde cedo: “pára de dar birra que eu te compro um pirulito!”. Parece que esperamos sempre uma recompensa pelo simples cumprimento do óbvio. Quem apenas cumpre a obrigação merece comendas de honra ao mérito. E holofotes, que absurdo!
Sempre exercitei qual seria o meu modo de resolver isso. Quando e se a maioria dos brasileiros quiser mudar esse estado de coisas, era só, num trabalho de formiguinha, um a um, sair do jogo e passar a isolar os que ainda persistissem nessa doença. Se houvesse uma atitude sincera, de pelo menos uns poucos, o processo se deflagraria e, talvez em alguns anos teríamos um Brasil diferente. Essa foi uma luta da qual covardemente me eximi. Essa teria sido a luta que gostaria de ter lutado. E não me alistei, o comodismo não deixou.
Em quinze minutos estarei caindo. Estive caindo por toda minha quase vida e isso nunca me incomodou. Sempre caindo, só doeu de verdade quando bati no fundo do poço. Quando estava no auge de uma carreira postiça de executivo de uma empresa de São Paulo. Tudo aconteceu muito rápido. Tinha então trinta anos. Há quatro tocava o escritório de negócios de uma empresa de informática que tinha sede em São Paulo. Dei sorte, fiz bons contratos, inclusive com o governo, o escritório virou uma filial importante. Competência? Nada, só uma baita sorte de estar no lugar certo, hora certa e eu lá, no meio daquilo tudo. Executivos importantes estavam sempre vindo supervisionar os negócios da “minha” filial, era só alegria. Almoços incríveis nas melhores churrascarias e farras etílicas nas muitas boates de Goiânia, e logo minha até então querida esposa, que cuidava do Bruninho e da recém nascida Camilla, já estava me dando bilhete azul...
As muitas viagens à matriz, no corre-corre atrás do sucesso, me distanciaram de meu pequeno ninho. Foi um processo imperceptível, mas sem volta. As brigas constantes em casa também contribuíram para um desfecho já inevitável. Alice, sempre nervosa e extenuada da lida com as crianças e deveres no consultório, me punia ficando mais irrascível e petulante. E eu, cego diante das maravilhas da vida desregrada de executivo antenado, de sucesso, me deixei levar ao sabor do vento.
Eu podia tudo. Sabia e controlava tudo e todos. Jantares e compromissos sociais quase todos os dias, sempre assediado, o fundo do poço estava próximo. E lá estavam as drogas. Começou como uma brincadeira, uma cheirada só para relaxar, esquecer a rotina e renovar forças. E pronto, estava numa roda-viva que em dois anos me tirou o emprego, a família, os amigos e as citações nas colunas sociais.
Aos trinta e quatro, já sem família, dinheiro e amor próprio, só me restavam dívidas com agiotas e traficantes. Estes, já temendo o prejuízo, passaram a me ameaçar.
Resolvi dar uma sumida. De carona, fazendo bicos até de estiva, andei o Brasil. A falta de dinheiro me distanciou da droga. As crises de abstinência me colocaram no umbral do inferno que eu pensava ser só invenção de catequistas diligentes. Numa dessas crises, num barranco de estrada, cortei um dos pulsos e só acordei no pronto-socorro da cidadezinha próxima porque tinha sido achado por um caminhoneiro que tinha parado para urinar. Teria me esvaído em sangue, se aquele sujeito tivesse ido mijar no quilômetro seguinte. O que eu estava fazendo? Liguei para meu pai. Choramos ao telefone. Pedi-lhe perdão pela pessoa que não fui. Enquanto me recuperava, passei a ajudar outros doentes no hospital, e descobri que jamais seria a pessoa que achava que era, mas poderia ser melhor do que aquilo que estava sendo. Me despedi de médicos e enfermeiros com uma pontada de orgulho daqueles heróis da saúde. É incrível como operam milagres no dia a dia desses hospitais sempre sub-aparelhados e onde falta tudo. Desejei que um daqueles tecnocratas do ministério da saúde precisassem um dia de socorro num hospital público e sentissem na pele o mal que suas estratégias erradas fazem ao brasileiro comum. Estava a mil e quatrocentos quilômetros de meus filhos e pais. Comecei a andar de volta. E, andando, comecei a ordenar meus pensamentos e priorizar atitudes. Tudo agora era mais claro. Começar do zero é sempre mais fácil.
Em pouco mais de um mês, já estava de volta aos cacos de minha vida. A esposa que eu abandonara dois anos antes, à época em que era o “yuppie” bem sucedido, já não mais me queria de volta. Já tinha inclusive outros planos amorosos. Meus filhos mal me reconheceram. O único apoio, encontrei em meus velhos. Meu pai ainda conseguia mostrar alguma alegria nos olhos cansados. Minha mãe, só chorava pelos cantos. Foi penoso o processo de convencê-los que gostaria de retomar minha vida, entrar nos eixos. Aos poucos, durante o processo de divórcio, retomei um diálogo passável com Alice, voltei a visitar regularmente os meninos. E, por intermédio de meu pai, me empreguei num Táxi Aéreo. No começo, só tampava buracos na escala e ficava sempre com a parte ruim do trabalho. Assim mesmo, foi muito bom voltar a voar. Em doze anos, havia voado muito pouco, geralmente só acompanhando algum velho companheiro de aeroclube.
Retomei os pagamentos da pensão de meus filhos. Me enterrei no trabalho. Voava muito e comecei a equilibrar minhas finanças. Meu pai resolveu se desfazer de alguns imóveis e me ofereceu o dinheiro para comprar meu próprio avião. Voltei a me sentir gente diante do Cherokee 72, deixei o emprego e me joguei como free-lancer. Época boa para ganhar dinheiro, Goiânia era ponto de partida de inúmeros vôos particulares, principalmente fazendas e garimpos. Tocantins e Mato-grosso eram os destinos mais comuns. Logo devolvi o dinheiro da compra do avião ao meu pai. Ele não queria, mas entendeu a importância daquele gesto para mim. E foi assim, de galho em galho, de garimpo em garimpo, cheguei aqui e agora, nessa enrascada negra!
Dez minutos. Já havia ouvido histórias de pousos impossíveis. Aliás, a primeira delas, me foi contada por meu avô materno, pioneiro de Tucuruí, no Pará, pela época da construção da usina. Um amigo dele, piloto voando algo de asa alta, meu avô não sabia nada de aviões, pousou sobre uma castanheira, a mais de trinta metros do chão. Quase sem ferimentos, resolveu descer por uma providencial corda que fazia parte da carga, e vagou quase trinta dias, guiado apenas pela bússola que havia arrancado do painel do avião acidentado, até encontrar uma estrada. O engraçado é que um helicóptero de salvamento encontrou o avião sobre a árvore logo no primeiro dia de buscas e estranhou a ausência do piloto, que poderia ter sido resgatado em minutos. É o engraçado nos dilemas mais comuns. Ir ou não, fazer ou não, ficar ou fugir? Seria mais fácil adivinhar antes o que seria melhor fazer e evitar o desastre.
Mas, além do tempo claro e bom, o resto estava contra mim. Não conseguiria voar a menos de cento e quarenta quilômetros por hora, mesmo com flaps ao máximo. O choque seria violento, normalmente, segundo o reportado em acidentes aéreos, a queda em áreas arborizadas era sempre complicada. Ao mergulhar contra árvores, o avião primeiro perdia as asas, que ficavam praticamente no lugar do primeiro choque. A cabine, se não se chocasse ao primeiro impacto, tinha tendência de se resvalar ainda por muitos metros. E o alumínio da fuselagem, normalmente com menos de meio milímetro de espessura, se rompia feito papel, deixando bordas cortantes que dilaceravam as vítimas de forma absurda. Gelei. A iminência de uma morte violenta voltava a me apavorar. Em que momento de minha vida deveria ter escolhido o outro caminho?
Lembrei-me de Alice, dessa vez com ternura. De quando era a moça ainda menina, comprida e magra, que me olhava da saída do balé, contra esquina do posto, quartel general da turma, que não perdia o lance para me gozar pelo resto do dia. Eu, vinte. Ela, dezessete. Naquela época eu não me prendia a nada sério. Namoricos de cursinho e serenata, mais nada. De vez em quando uma namorada mais velha, que pagava as contas de bar. Mas aquela menina era diferente, essa era pra casar!
Passei a freqüentar o posto de olho nos horários da minha bailarina. Quando a troca de olhares já não escapava a ninguém, resolvi me aproximar e, gaguejando, perguntei pelo seu nome. Alice. Morava ali perto, estava se preparando para o vestibular de odontologia. Fazia balé por prescrição médica: correção de postura. Papos rápidos, sob a saraivada de vaias e guinchos daqueles porqueiras que se diziam meus amigos. Ela ficava sem graça e se afastava logo.
Um dia criei coragem e pedi para acompanhá-la até sua casa. Conversamos por mais tempo, beijinho no rosto na despedida. Começamos a estudar juntos, ela me ajudava na decoreba da biologia e química, eu dava a ela uns empurrõezinhos em matemática e física. Estudar foi a forma de ficarmos juntos mais tempo. E fomos ficando, a turma do posto foi me esquecendo, a força do hábito foi nos unindo e viramos carne e unha. Quando meu pai emprestava o carro, íamos ao cinema, ao clube, lanchonetezinhas comportadas, nunca à noite. Seu Oswaldo, pai dela, dentista do exército, major, era pedreira: estava sempre vigiando e me ameaçando com os olhos. Passamos no vestibular. Ela, odontologia na Federal e eu, Engenharia na Católica, tudo bem adequado. Estudiosa, chegava a me dispensar para estudar para as provas. Eu, malandro, ia só empurrando. Comecei a estagiar, fui pegando gosto por administração de obras e informática. Comecei a ajudar em escritórios de projeto e orçamento. Sempre que podia estava na casa de minha agora namorada. Nem sei direito quando começamos a namorar, acho que foi quando meu sogro já pensava que eu era só mais uma peça do mobiliário da casa...
No terceiro semestre da faculdade, surgiram oportunidades imperdíveis no meu trabalho. Passei a desenvolver programas aplicados à área de engenharia. Já estava trabalhando dia e noite, tive que trancar a matrícula no meu curso. Choradeira geral, mas convenci a todos que seria por pouco tempo, e assim foi mais um ano e ninguém mais falou nisso. E tome trabalho. O tempinho que tinha era para estar com Alice. Começamos a falar em casamento, era inevitável, num namoro então de quase três anos. Já estávamos preocupados com possíveis flagrantes do que estávamos fazendo no sofá do major.
Alice já estava no último ano do curso de odontologia quando ficou grávida do Bruninho. Corre-corre geral: marca casamento, compra enxoval, aluga apartamento, compra mobília, faz convite, contrata fotógrafo e marca passagem, até lua-de-mel teve. Os acontecimentos quase fizeram a aplicada Alice perder o ano na faculdade. Até hoje penso que foi preciso mais do que boa vontade dos diretores da escola, para que ela colasse grau.
Quando penso sobre essa época de minha vida, as coisas vêm e vão, em preto e branco. Alice e eu trabalhamos muito, as contas nunca fechavam, as despesas eram enormes, tudo era feito com muito sacrifício. Aluguel, condomínio, babá, prestação dos carros, do equipamento do consultório, do terreno, da máquina de lavar, nossa vida lembrava o chinês de circo que equilibra pratos naquelas varas compridas, e sempre em número crescente, até o momento em que eles quase começam a cair. A rotina era estafante, tudo era cronometrado e sofrido, tinha pena de Alice. E passei a ser mais tolerante com suas pequenas crises de nervos. Procurava sempre estar disponível, dando atenção, às vezes até carinho. Sentia-me desajeitado, mesmo quando tentava ajudá-la, nas mais pequeninas coisas. Ela sempre dizia que eu atrapalhava mais do que ajudava. Era fralda, remédio, mamadeira, lencinho para isso, paninho para aquilo, sabonete assim, pomada assado, chupeta, chuca, carrinho, chapéu, e tinha ainda as coisas da casa. E tudo isso além do consultório. Alice passou a sonhar apenas com o dia em que teríamos condição de ter outra empregada além da babá, que insistia em dizer que Bruno não dava tempo para ela fazer mais nada.
Na informática, as coisas evoluíam devagar, mas sempre. Quando Bruno fez três anos, abri meu próprio escritório e as perspectivas melhoraram. Logo estaria representando a tal firma de São Paulo.
Cinco, seis minutos. O filme da minha vida cabe num curta metragem de quinta. O que deu errado? A resposta, agora, quase tarde demais, é clara e alta: deu tudo errado porque quis que desse certo. As coisas foram acontecendo e eu, querendo que elas parecessem que estavam seguindo o curso correto, fui me ajustando a elas, e vestindo-as de decisões acertadas. No fim queria que tudo desse certo, queria ganhar dinheiro, dar conforto para a família, ser respeitado por meus pares. Querer isso ou aquilo, querer sempre demais. Eu quero, logo existo. Errado. Fazer uma enxurrada de acontecimentos se travestir de vida planejada, dando à minha vida o aspecto de que tudo ia bem, foi um erro capital. Querer apenas não é só egoísmo, é burrice. Se você apenas quer que as coisas aconteçam e nada mais faz para conter o rumo do que acontece à sua revelia, o que se tem é um monte de coisas desordenadas que ao invés de conserto, vão receber apenas roupagem de acontecimentos pensados e conduzidos. E você vai se moldando àquele torvelinho de coisas e acaba se perdendo. Desaparece a pessoa que você achou que era, dando lugar a essa pessoa que você precisa parecer que é. Ao final você acaba barbeando um estranho, ao espelho, todas as manhãs.
Nenhum comentário:
Postar um comentário